segunda-feira, março 15, 2010

KANT vs. MILL

Eis como, através de uma breve história, me proponho ilustrar a diferença entre a deontologia kantiana e o utilitarismo milliano.
Preparados? Partamos.

Imaginem um robot binário que reage unicamente a dois tipos de estímulo - a: ao carácter de um aluno perturbador, desses que não se aquietam ao longo de uma aula inteira, conversando, irritando, boicotando; e não-a: ao carácter de um professor inteligente e dotado de uma voz potente.

Perante o primeiro tipo de estímulo, a reacção do robot consiste em prender o referido aluno, sufocando-o vagarosa mas implacavelmente. Podemos imaginar que, sob o terrível abraço, o aluno sinta medo. Mas, quanto mais medo sente, mais o seu carácter de criatura estúpida e repulsiva vem ao de cima e, portanto, o medo só precipita o seu fim.

Nada senão a voz potente de um professor, que diga «Pára!», consegue interromper o fatal abraço.

Vamos presumir que o professor - digamos: eu - sabe que, salvando o aluno, terá de o suportar nas suas aulas por um longo futuro, incomodando-o, infectando a turma, prejudicando a maioria e irritando o próprio e perfeito professor.

(E não me venham dizer que o aluno, profundamente grato ao seu salvador, se arrependeria e emendaria. Porque isso seria num conto de fadas, e o meu registo é outro: o de uma hipótese científica, onde, portanto, todos sabemos que um aluno deste género, salvo pelo professor, se tornaria ainda mais insuportável nas suas aulas).

Deve o professor que passa pelo pior dos seus alunos, vendo-o sujeito ao abraço da morte, pronunciar a palavra salvadora? O decisivo «Pára!»?

Kant afirma que sim. Independentemente das consequências. Independentemente de o professor prejudicar o seu futuro e o da maioria das pessoas que merecem a sua preocupação e dedicação (isto é, os alunos bons e interessados daquela turma). O meu dever é o meu dever. Único e inegociável.

Mill, pelo contrário, pensa que o bem é, tão-só, o que se revela mais útil à maioria: o que beneficia o grupo (ainda por cima de rapazes e de raparigas simpáticos, que seguiriam - se a aventesma os não impedisse - atentamente as aulas).

E, perante este dilema, prefiro calar-me!

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