terça-feira, maio 17, 2011

INSINUAÇÕES

Um plágio pressupõe, de algum modo, uma história secreta de paixão. Gosta-se tanto de uma música ou de uma ideia, que, afeiçoando-se a elas, um tipo se arrisca a reformulá-las. Inconscientemente. Plagiamos muitas vezes sem querer, sem nos apercebermos desse amor que nos move, dessa inconsciente tendência para repetir o que incorporámos. Influências que ressoam muito próximas, marcas, no que fazemos, que trazem um outro nome inscrito. Torna-se muito difícil determinar o que é ou não um plágio. O que ainda não é e o que já principiou a sê-lo. O que é repulsivo, isso sim, é o roubo: quando passo por meu um texto que sei que o não é. Quando copio e aponho o meu nome no trabalho de outrem..

Descubro, ultimamente, que «plágio» é também uma arma de arremesso. E das mais terríveis, porque insinuando, muitas vezes anonimamente - e quase sempre levianamente - deixamos estragos, minamos credibilidades, depositamos excremências no que é sério e límpido. Actua como um veneno lentíssimo: pode não matar, em todo o caso nunca mata rapidamente, mas influencia, perverte, subverte.

A blogosfera, percebi eu ultimamente, está toda inquinada por estas lutas. Entre leitores de blogues. Anónimos que passam no seu voo lesto, como pombos: deixam o cocó na lapela de um ser humano e desaparecem. (Mas regressarão, certamente). Fazem-no acerca de pessoas que respeito e admiro. E por quem poria as mãos no fogo: basta lê-las bem. O que me custa compreender, para além dos roubos (que nunca compreendi), é a acusação feita assim, de ânimo leve. O que me custa mesmo compreender é a consciência de uma pessoa assim: que alçapões, que caves, que tortuosos labirintos. Que invejas e que ressentimentos encobertos, e a coberto do anonimato.

2 comentários:

Teresa disse...

Cheguei a este seu post por indicação do José Pacheco.
Ainda há pouco também eu fui alvo de acusação de plágio. Por anónimos, pois claro. Todas as pessoas que me defenderam comentaram identificadas, as acusações (ridículas, diga-se de passagem) vinham todas das trevas.
Mas por mais inocente que se esteja, e é o meu caso, é uma sensação terrível pensar que alguém, por um instante que seja, possa acreditar que plagiámos.

Sobre o meu suposto plágio e outros:
http://gotaderantanplan.blogspot.com/search/label/Pl%C3%A1gios

Um abraço.

M P P disse...

Gostei de ler a análise (aprofundada como é habito), acerca de plágios que o são e que não o são. Acrescentaria uma breve nota acerca do tema, que me nasce da minha relação com a música:
Quantos milhões de diferentes melodias escutamos ao longo de uma vida de melómanos? Quantos milhões de frases, de silêncios e de relações entre si escutámos? Como recordar cada uma? No acto de criar, como evocar e trazer ao domínio do consciente, o que o som que nunca recordámos? Missão certamente impossível para o autor de melodias. Algo de semelhante se poderá dizer de quem usa a escrita como meio de expressão: Ao fim de décadas de diversificadas leituras como recordar o que se leu e como avaliar o peso do tudo isso, na nossa criação?
Carlos Augusto Silva