segunda-feira, janeiro 19, 2015

POSSIVELMENTE PENSARÃO QUE ESTOU COM GRIPE É DA CABEÇA


Não fazia a menor ideia de que a casa que arrendei tinha fantasmas. Como é possível, tratando-se de um apartamento num prédio de construção recente?
A razão por que nunca os encontrara é simples: evitaram-me. [Devo ser tão má companhia que até os fantasmas me evitam.] Suponho que ficaram algum tempo sossegados, observando os meus hábitos, registando a minha rotina. Depois, adaptaram os seus horários aos meus, em contracorrente: enquanto eu saio para trabalhar, instalam-se. Produzem vinho branco. Quando regresso, desaparecem. Refugiam-se. Vão dormir, ou fazer o que quer que os fantasmas façam quando não andam a assombrar ou a produzir vinho.

Hoje, faltei. Caçado por um princípio de gripe que não me deixava andar, nem correr, nem meditar, nem cantar ou ver televisão, sem medicamentos nem coragem para sair à rua a comprá-los ao frio, os membros doridos, a cabeça mais pesada do que o habitual, enfiei-me na cama e desliguei.

Ao acordar, vi-os. Na sua azáfama, muito brancos, ou diáfanos, como outros tantos engripados, invadiam o espaço, atravessavam paredes, planavam, produziam.

O vinho branco que eles fazem, aliás, é de excelente qualidade.

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