quinta-feira, abril 26, 2007

CRÍTICA TELEVISIVA

Tenho, como aforismo pessoal que a experiência parece insistir em confirmar, a convicção de que as coisas com que mais aprendemos nesta vida não são as coisas bem feitas: são, precisamente pelo contrário, as mal feitas.

Em televisão, o aforismo é continuamente validado.
Há um programa da tarde, com um público-que-aplaude-ao-vivo, construído segundo um conceito que tem como alvo as mulheres idosas e as donas-de-casa, frustradas, de lágrima fácil, e que eu principio sempre por ver ociosamente (e até com aquele ligeiro ar de enfado que, nestas coisas, convém a um intelectual que se preza), mas que, no seguimento, acaba por me prender com a força de um «thriller»; pois bem: afianço-vos que esse programa tem sido, para mim, um verdadeiro poço de ensinamentos.
Para já, ensina-me a que ponto pode descer a tonteria, o desejo de aparecer em televisão, de ganhar uns prémios pindéricos ou a simplicidade com que se consegue fazer rir. Mas mais: depois, a propósito disto ou daquilo, há sempre umas quantas lições a retirar - muitas vezes, carregadas de consequências para outros campos, para outras áreas de interesse.

Neste último programa, tive, diante dos olhos, a razão clara (de que, às vezes, posso esquecer-me no meu dia-a-dia profissional) pela qual um professor nunca deve ir para uma aula sem a ter preparado convenientemente.

Os sucessivos desastres a que a apresentadora foi conduzida pelo facto de não haver preparado as entrevistas com aquelas velhinhas, sobre os «escapes» que tinham encontrado para afugentar os azares e as tristezas da vida.
Assistimos a coisas do género de: «Eu soube que gosta muito de ler», «Ah, quem me dera, não, minha senhora, infelizmente não sei ler», ou: «Já estou a ver que é Alentejana», «Não, sou da Beira-Baixa», ou: «É verdade que não esteve para aturar o seu marido durante muito tempo?», «Ele morreu» (será que foi a senhora que o assassinou, para não o «aturar durante muito tempo»?)

Um programa didáctico, da BBC, poderia ter tido esta força sobre mim, este poder de ilustração e de me colocar perante mim próprio? Duvido.

Bem-haja, TVI.

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