quarta-feira, janeiro 06, 2010

O DUELO

Hans e Karl olham-se perigosamente.

Não se conhecem. Em rigor, nada têm um contra o outro. Noutro lugar, noutras circunstâncias, num tempo diferente, quem sabe?, talvez pudessem ter sido amigos.

Não podem dar-se ao luxo de sondar e perceber que afinidades os ligam. Imaginem que, se começassem a conversar, descobriam que, em miúdos, haviam sido vizinhos e jogado juntos à bola. «Não me digas! Então tu eras o Karl, o que ficava sempre à baliza porque não era capaz de chutar decentemente?». E o outro: «Não era assim tão mau! Aliás, se bem me lembro, tu é que eras o Hans, que só jogava por ser o dono da bola...» - e sob estas palavras de aparente inimizade, dariam palmadas amigáveis no ombro um do outro, desabariam gargalhadas, iriam tomar uma cerveja, algures, recordando e rindo. Quem sabe, quem sabe?

Mas não hoje. Não aqui. Não agora.

Medem-se. Nenhum quer dar o primeiro passo. Nenhum dos dois se quer expor.

Lá fora, a chuva inclemente faz-se ouvir.

Não podem ficar ali eternamente. Algum terá de ser o primeiro a ousar.

É Karl.

Corre.

Hans principia também a mover-se.

Karl é mais lesto:
Pega no solitário guarda-chuva que se encontra no bengaleiro, e não pertence, obviamente, a nenhum dos dois - mas a um desgraçado que ainda não sabe, nesta altura, que ficará sem o seu guarda-chuva -, corre para a porta. Abre-o. Mete-se à chuva.

«Merda!», indigna-se Hans. «Vou apanhar uma molha valente».

1 comentário:

zorbas disse...

zorbas hans voltou!