sexta-feira, dezembro 02, 2005

LE BLOGUE C'EST MOI

Sempre li na célebre frase de Luís XIV, «L'État c'est moi», o mais extremo exemplo de arrogância absolutista, a ilustração perfeita do poder egocêntrico ao qual tudo e todos serão sacrificados. Neste momento, de cabeça solitariamente tombada sobre o meu blogue, que ninguém comenta, que talvez ninguém leia, ou que, porventura, uma ou outra alma venha rapidamente a aflorar, numa espécie de zapping de blogues, antes de passar de imediato ao seguinte, consigo interpretar de outro modo o L'État c'est moi. Porque me reconheço - com leves diferenças - nessa ideia de coincidir, inteira, absoluta e solitariamente, com qualquer coisa. Neste caso, com o meu blogue. Não há um eco, não há uma resposta. Não há um aceno ao longe. Por esse universo infinito deslizo, montado no sótão de uma casa em S. Domingos de Rana, dentro de um planeta em vias de extinção, teclando em vão num computador, como em busca de sinais de vida inteligente - que não vêm, que não vêem, que não me lêem! Na frase de Luís XIV percebo, hoje, um grito de solidão, um desespero sem remissão. Ninguém quer ser, sozinho, o Estado. Ninguém quer ser, sozinho, um blogue inteiro. Ninguém quer ser sozinho. E dou por mim a pensar: não é possível que nada do que vou escrevendo interesse a ninguém mais senão a mim próprio, e às vezes nem mesmo a mim mesmo. E dou por mim a pensar: como pode ter acontecido esta espécie de erro genético que é, no meu caso, até um blogue, caramba!, até esse privilegiado instrumento de comunicação e comércio de ideias, que é um blogue, ter-se transformado em mais uma forma de solidão. Como se, para continuar a pensar de mim para mim, para continuar falando comigo, fizesse qualquer sentido a mediação da internet. Porra!

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