Num livro que tem sido apresentado como «revolucionário», um autor norte-americano - penso eu, mas talvez erre; será, porventura, um preconceito, mas estas «revoluções» parecem-me tipicamente americanas - sustenta que tudo aquilo praticamente que sempre se pensou ser prejudicial aos adolescentes é, afinal, benéfico para o seu desenvolvimento. O excesso de televisão. Os videogames. Os telemóveis. You name it. Nós, até agora, preocupados com os nossos filhos, evitando parvamente que eles se alienassem com os jogos de computador e outros vícios da cultura de massas e, pelo contrário, os jogos e os vícios a despertar-lhes as mentes, rasgando-lhes fronteiras à inteligência, adestrando-os e aperfeiçoando-os...! O tempo que desperdiçámos a mandá-los estudar aos invés de os deixarmos colados ao ecrã, movendo ruidosamente os polegares sobre os botões da consola para disparar rajadas contra as naves invasoras.
Sei que não há, nesse livro, nada de científico. O registo é o da argumentação. E desconfio muito dessa retórica de que se tecem teorias cómodas. Fujo delas como o diabo da cruz: sofro de um leve enjoo quando oiço um psicólogo pedir «tempo de qualidade» por oposição à «quantidade», querendo convencer-me de que os pais geralmente muito ocupados podem ser melhores do que os outros se forem capazes de fazer do quarto de hora em que estão com os filhos um quarto de hora a sério, de «qualidade», cheio de histórias e brincadeira.
Haverá sempre um psicólogo para entoar loas às virtudes do macDonald's, da coca-cola, das pipocas no cinema. Há-de haver um psicólogo pronto a justificar - pior, a tomar como exemplo salutar - o comportamento desses pais negligentes que atafulham as crianças, as mimam em excesso, lhes não negam nada, lhes oferecem jogos em vez de atenção.
Compensa-se a irresponsabilidade dessas teorias com o tom revolucionário e provocatório que elas ostentam, o irresistível cunho de novidade e, sobretudo, o efeito de desculpabilização para consciências atormentadas de alguns pais.
Para muitos, é um óptimo negócio.
sábado, julho 29, 2006
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