Não sei por que me pareceu boa ideia ir passar a terça-feira gorda a uma aldeia alentejana.
De lá, da dita aldeia (já cidade, aliás) garantiam-me, com a esperada entoação cantada: «Anda, vás vêr que o corso carnavalêsco é aqui muito engraçadú!».
E eu fui. Fiz pior: convidei amigos. O inefável M., coitado, para que fosse com a sua família juntar-se, na citada aldeia já cidade, à minha prória família (o que é castigo bastante: convidar alguém que não haja cometido qualquer crime nem tenha contribuído para a fabricação dos meus filhos - que se saiba! -, a conviver com eles ...)
Tínhamos combinado, sob as ordens irrevogáveis da senhora dona sogra, que, saindo de Reguengos, íamos todos almoçar à bela Monsaraz, gozando a paisagem que se nos estenderia das ameias do castelo abaixo, enquanto degustávamos umas migas ou uma carne de porco, regadas com um tinto. Mas tínhamos de estar de regresso a Reguengos às catorze horas, nem um minuto mais, de forma a podermos assistir à saída de um corso que, segundo a sogra, não ficava atrás do que de melhor se faz no Rio de Janeiro ou mesmo em Loulé.
Assim se fez.
À entrada em Monsaraz, ainda se nos ouviam maravilhados e comovidos «Ahs», «Ohs» e «Uiiiiiiiiiiiiiins» (estes últimos, obviamente, da goela da petiza...)
A tragédia só principiou a mostrar as unhas no momento em que tentámos o primeiro restaurante. Não sei como, quando nos contámos, éramos treze! Queríamos uma mesa para treze pessoas - em Monsaraz - à hora do almoço - na terça-feira gorda. Receberam-nos, evidentemente, com desprezo e troça. Em pronúncia alentejana, que faz soar ainda mais despreziva e trocista o desprezo e a troça. Não nos levaram, talvez, a sério. Gritaram-nos, por fim, «Nem pensari!».
No segundo restaurante, igual recepção.
O mesmo no terceiro.
Andámos às cabeçadas, à torreira do sol, de restaurante em restaurante, deparando com todos eles a abarrotar de gente que se regalava com as migas e a carne de porco.
Percebemos que, se insistíssemos em comer, não poderia ser em Monsaraz.
Novos planos da sogra. Reenfiámo-nos, então, nas viaturas. Procurámos uma aldeia adiante. O parque de estacionamento, com carros em cima uns dos outros, fez-nos entender que nem merecia a pena parar.
Entretanto, eram catorze e trinta. A lírica ideia de estarmos às duas em Reguengos já passara de moda. Íamos à cata de tascas, tabernas, fosse o que fosse. Na aldeia mais à frente também não conseguimos convencer proprietários nem empregados façanhudos.
Voltámos a Reguengos a estoirar de fome. Vamos ao «Barril»? Boa! É do baril!
No «Barril», já, portanto, em Reguengos, tivemos de nos dividir por duas mesas.
Um jovem de buço mal semeado veio tomar notas, mas éramos muitos, estávamos cheios de fome, o calor apertava, falávamos ao mesmo tempo, o rapaz enervava-se, desapareceu e não tornou a aparecer. Veio, em seu lugar, um quase adulto que nos pediu desculpa, mas que o mocito se sentira indisposto e, portanto, teríamos de refazer todos os pedidos.
Entre diversas e confusas exigências, um de nós encomendara uma picanha, mas ressalvando, talvez preocupado com a linha ou com a saúde, que não trouxessem batatas fritas. «Em vez disso, por favor, veja lá, por exemplo um arrozito...»
A comida demorava a chegar. Não deixei de reparar, mais tarde, que a picanha do dito veio, finalmente, carregada. De batatas fritas.
Chamámos o quase adulto, explicámos-lhe que se preferia realmente arroz.
Voltou dali a pouco. Explicou que o arroz acabara mas, entretanto, tomara a liberdade de mandar fritar mais umas batatitas que, aliás, eram literalmente três ou quatro palitos num pirezinho de tremoços.
Na parte das sobremesas, então, parecia nada haver já. A não ser o doce da casa. «E isso é bom?» Oh, sim, oh, sim, delicioso. E o quase adulto esmerava-se na explicação convincente, apurava-se na descrição dos ingredientes e dos processos. Estávamos rendidos. Saiu por um instante. Ei-lo: Tinha-se enganado, já não havia doce da casa!
Saímos atrás de uma música roufenha, que nos acenava lá de fora. «Querem ver que o corso não anda longe?» Era, de facto, o corso: uns alentejanos vestidos de mulher, muitos miúdos mascarados de palhaço, cornetas e papelinhos.
No Brasil não há disto!
Nem em Loulé!
terça-feira, fevereiro 24, 2009
domingo, fevereiro 15, 2009
UM RAIO DE UM DOMINGO
1. Hoje de manhã, tendo decidido passear ao sol com a pequenina Daisy, vi-me bruscamente obrigado - com ela ao colo - a esperar que passasse, primeiro, toda uma série de corredores de alguma maratona amadora. Ansiava por ver entre eles, a qualquer momento, a figura bem conservada de José Sócrates, que um jornal de comediantes espanhóis, atrevidos, conseguiu convencer que era o sexto homem mais elegante do mundo. Eu esperava-o ali, porque penso que, em Portugal (e, como se sabe, mesmo fora de Portugal), nem são permitidas maratonas sem a presença de Sócrates em calção de lycra. Mas, desta vez, nada feito. Não o vi...
Passavam umas meninas a arfar, uns velhos a cair da tripeça, escarrando ruidosamente pelo caminho, uns jovens de grande arcabouço, mas que se mostravam, vergonhosamente, com sérias dificuldade para ultrapassar dois ou três velhinhos rijos (daqueles que, certamente, treinam todas as manhãs a chegar primeiro do que nós às caixas multibanco, só para nos fazer aguardar, quando mais temos urgência, que eles paguem não sei quantas facturas...)
Dei por mim a matutar acerca do que podia levar aquela gente, sem ganhar nada de especial com isso, nem sequer, se calhar, uma medalha, a puxar assim pelo corpo, sob os raios do sol (ainda de inverno, é certo, mas qualquer das maneiras...!) Era difícil que me apanhassem num tamanho cansaço, correndo por gosto entre outros malucos. A não ser que me dessem a escolher. Por exemplo: entre isso ou levar a minha filha a um circo.
2. Como não tive tal escolha, durante a tarde coube-me levar os meus dois rebentos... ao circo!
Tratava-se, de resto, de um cirquinho pobre.
O Duarte tinha-me perguntado se eu achava que haveria animais.
Respondi-lhe que só animais de pequeno porte. Piolhos e pulgas haveria de ter, com certeza.
«Ai sim?», quis saber, excitado. «Também treinam piolhos?»
Santa inocência adolescente. Ou sarcasmo precoce?
Devo dizer que o número mais arriscado daquele circo pobre foi o das bailarinas que não conseguiam acertar com as coreografias. À parte isso, o verdadeiro risco foi vivido por nós, mergulhados num paciente público, sentados nuns periclitantes madeiros de bancada - particularmente eu, com uma adesiva Daisy ao colo e um saco (que se partiu, por fim) contendo uma merenda de iogurtes e bolachinhas.
Houve aquela parte - também arriscada para mim, que a vivi de respiração suspensa - em que o palhaço procurava, entre as pessoas do gentil público, algumas dispostas a ir até à pista fazer figuras tristes. Mas escapei-me.
Saímos muito, muito, muito fatigados. Completamente derreados.
E não havia animais.
Ou por outra, não posso jurar: tenho sentido muita comichão na cabeça!!!
Passavam umas meninas a arfar, uns velhos a cair da tripeça, escarrando ruidosamente pelo caminho, uns jovens de grande arcabouço, mas que se mostravam, vergonhosamente, com sérias dificuldade para ultrapassar dois ou três velhinhos rijos (daqueles que, certamente, treinam todas as manhãs a chegar primeiro do que nós às caixas multibanco, só para nos fazer aguardar, quando mais temos urgência, que eles paguem não sei quantas facturas...)
Dei por mim a matutar acerca do que podia levar aquela gente, sem ganhar nada de especial com isso, nem sequer, se calhar, uma medalha, a puxar assim pelo corpo, sob os raios do sol (ainda de inverno, é certo, mas qualquer das maneiras...!) Era difícil que me apanhassem num tamanho cansaço, correndo por gosto entre outros malucos. A não ser que me dessem a escolher. Por exemplo: entre isso ou levar a minha filha a um circo.
2. Como não tive tal escolha, durante a tarde coube-me levar os meus dois rebentos... ao circo!
Tratava-se, de resto, de um cirquinho pobre.
O Duarte tinha-me perguntado se eu achava que haveria animais.
Respondi-lhe que só animais de pequeno porte. Piolhos e pulgas haveria de ter, com certeza.
«Ai sim?», quis saber, excitado. «Também treinam piolhos?»
Santa inocência adolescente. Ou sarcasmo precoce?
Devo dizer que o número mais arriscado daquele circo pobre foi o das bailarinas que não conseguiam acertar com as coreografias. À parte isso, o verdadeiro risco foi vivido por nós, mergulhados num paciente público, sentados nuns periclitantes madeiros de bancada - particularmente eu, com uma adesiva Daisy ao colo e um saco (que se partiu, por fim) contendo uma merenda de iogurtes e bolachinhas.
Houve aquela parte - também arriscada para mim, que a vivi de respiração suspensa - em que o palhaço procurava, entre as pessoas do gentil público, algumas dispostas a ir até à pista fazer figuras tristes. Mas escapei-me.
Saímos muito, muito, muito fatigados. Completamente derreados.
E não havia animais.
Ou por outra, não posso jurar: tenho sentido muita comichão na cabeça!!!
sábado, fevereiro 14, 2009
A SURPRESA DO DIA DOS NAMORADOS
Klaus Constantin era um caso sério de incompreensão do feminino.
Para ele, tudo o que vagamente soasse a feminino, pertencia a uma espécie de castelo belo mas cerrado, luminoso, perfumado e palpitante de vida, mas rodeado por um lago de crocodilos; era um templo brilhante, que o atraía, evidentemente, mas em cujo sentido era incapaz de penetrar: ele lembrava, diante desse mundo secreto, certos meninos pobres que, nas noites de consoada, se postam, tristemente, à janela de mansões festivas aonde nunca terão acesso.
Os amigos conheciam-lhe essa faceta e riam-se dela. Havia histórias perfeitamente ridículas - que eles gostavam de repetir até ao ribombar asmático de gargalhadas - acerca do total desajustamento e da infeliz cegueira de Constatin para o sentido do mundo feminino.
Mais do que os amigos, a mulher de Klaus, Olga Constatin, era a primeira a pensar que o seu marido nunca, nunca, nunca seria capaz de perceber de que substância material e espiritual era uma mulher feita.
Foi talvez por esse motivo que, no dia dos namorados, Klaus Constatin jurou a si mesmo que estaria à altura.
(Essa preocupação - pensou - era já até, talvez, um início da compreensão: pois é precisamente por essa atenção amorosa - pensou - que se principia, talvez, a entender a mulher...)
Jurou que a surpreenderia e, por extensão, aos seus amigos trocistas.
Levou uma semana a preparar a surpresa, mudando de ideias, reajustando formas. Achou que deveria acordar muito cedo de maneira a que, quando Olga chegasse à mesa da cozinha, deparasse com uma rosa junto a um pequeno-almoço...
Mas foi desistindo das várias hipóteses. Nenhuma lhe parecia vir aninhar-se na secreta e estranha essência daquilo que uma mulher realmente deseja!
Até que, na véspera do Dia dos Namorados, tinha chegado ao plano indubitável. Como duvidar do seu poder?
No dia 14 de Fevereiro, cuidou de que, quando a esposa entrasse em casa, fosse encontrar, insinuantemente espalhadas pelo chão, as várias peças de roupa que ele fora despindo num strip-tease que, ao mesmo tempo, desenharia o rasto que Olga tinha de seguir, as calças aqui, a camisa adiante, a camisola interior no primeiro degrau da escada, uma peúga mais acima, outra já próxima do quarto, as cuecas à porta, a porta entreaberta, de maneira a que, no fim do trilho de roupa despida, o visse a ele, esperando-a, nu, nu, nu, num leito cheio de pétalas de rosa...
Entrou na cama, nervoso, ansioso, treinando poses sensuais, rindo-se por dentro da surpresa, quando ouviu a voz agreste de Olga, gritando-lhe de baixo:
- Mas és maluco, ou quê? Agora já nem pões as tuas porcarias no cesto da roupa suja? Pfff, que pivete! Este cheiro é das cuecas, ou quê?! Sou sempre eu a arrumar, sempre eu a arrumar. Olha para isto, tudo espalhado. Até me apetece chorar! Não és nenhuma criança, que diabo! Já não tens idade para te comportar com tanta falta de cuidado. Não há direito. Mas que merda de vida! Sou uma escrava. Sou uma escrava.
Antes que Olga o visse naqueles preparos, recolheu as pétalas e escondeu-se na casa-de-banho do quarto.
Estava frio. Não tinha roupa, só poderia sair quando ela não andasse a rondar.
Não. Não, de facto: ainda não principiara a perceber o mundo das mulheres.
Para ele, tudo o que vagamente soasse a feminino, pertencia a uma espécie de castelo belo mas cerrado, luminoso, perfumado e palpitante de vida, mas rodeado por um lago de crocodilos; era um templo brilhante, que o atraía, evidentemente, mas em cujo sentido era incapaz de penetrar: ele lembrava, diante desse mundo secreto, certos meninos pobres que, nas noites de consoada, se postam, tristemente, à janela de mansões festivas aonde nunca terão acesso.
Os amigos conheciam-lhe essa faceta e riam-se dela. Havia histórias perfeitamente ridículas - que eles gostavam de repetir até ao ribombar asmático de gargalhadas - acerca do total desajustamento e da infeliz cegueira de Constatin para o sentido do mundo feminino.
Mais do que os amigos, a mulher de Klaus, Olga Constatin, era a primeira a pensar que o seu marido nunca, nunca, nunca seria capaz de perceber de que substância material e espiritual era uma mulher feita.
Foi talvez por esse motivo que, no dia dos namorados, Klaus Constatin jurou a si mesmo que estaria à altura.
(Essa preocupação - pensou - era já até, talvez, um início da compreensão: pois é precisamente por essa atenção amorosa - pensou - que se principia, talvez, a entender a mulher...)
Jurou que a surpreenderia e, por extensão, aos seus amigos trocistas.
Levou uma semana a preparar a surpresa, mudando de ideias, reajustando formas. Achou que deveria acordar muito cedo de maneira a que, quando Olga chegasse à mesa da cozinha, deparasse com uma rosa junto a um pequeno-almoço...
Mas foi desistindo das várias hipóteses. Nenhuma lhe parecia vir aninhar-se na secreta e estranha essência daquilo que uma mulher realmente deseja!
Até que, na véspera do Dia dos Namorados, tinha chegado ao plano indubitável. Como duvidar do seu poder?
No dia 14 de Fevereiro, cuidou de que, quando a esposa entrasse em casa, fosse encontrar, insinuantemente espalhadas pelo chão, as várias peças de roupa que ele fora despindo num strip-tease que, ao mesmo tempo, desenharia o rasto que Olga tinha de seguir, as calças aqui, a camisa adiante, a camisola interior no primeiro degrau da escada, uma peúga mais acima, outra já próxima do quarto, as cuecas à porta, a porta entreaberta, de maneira a que, no fim do trilho de roupa despida, o visse a ele, esperando-a, nu, nu, nu, num leito cheio de pétalas de rosa...
Havia mesmo um levíssimo perfume a sândalo no ar.
E teve de se apressar quando ouviu o carro chegar, regressado das compras.
Entrou na cama, nervoso, ansioso, treinando poses sensuais, rindo-se por dentro da surpresa, quando ouviu a voz agreste de Olga, gritando-lhe de baixo:
- Mas és maluco, ou quê? Agora já nem pões as tuas porcarias no cesto da roupa suja? Pfff, que pivete! Este cheiro é das cuecas, ou quê?! Sou sempre eu a arrumar, sempre eu a arrumar. Olha para isto, tudo espalhado. Até me apetece chorar! Não és nenhuma criança, que diabo! Já não tens idade para te comportar com tanta falta de cuidado. Não há direito. Mas que merda de vida! Sou uma escrava. Sou uma escrava.
Antes que Olga o visse naqueles preparos, recolheu as pétalas e escondeu-se na casa-de-banho do quarto.
Estava frio. Não tinha roupa, só poderia sair quando ela não andasse a rondar.
Não. Não, de facto: ainda não principiara a perceber o mundo das mulheres.
quinta-feira, fevereiro 12, 2009
O REGRESSO DE D.J. CARA DANJO A PROPÓSITO DO BICENTENÁRIO DE UM SENHOR
a minha prófe de bilogia dís k çe condecóra ôje o bissentnário do çenhôr xárles dárling. condecorársse o bissentnário kér dizêr k çe o çenhôr fôusse vivo fazía ôje bissentos ânos. cômo o mén não é vivo não pudêmos típo dárle os parabéins e iço mas cômo gustâmos bué de féstas e cômo túdo nos çérve para festejár lá festejâmos o bissentnário dêste gáijo k inda purssima não fêz náda de ispessiál a não çêr dizêr tipo k o pái dêle éra un macáco. óra dizêr iço do çêu peróperio cóta não me parésse tipo un ganda avãço na siênssia. bêm sei k ás x taméin me açusto quando vêijo o mêu cóta de manhã ao levãtár da câma con a bárba por fazêr e iço. mas não me atrêvo a dizêr típo k êle é um macáco. éra o fín da macacáda.
terça-feira, fevereiro 03, 2009
PLANTADO EM NADA
Depois do ruído que o apavorara ao longo da noite inteira, o vento a soprar desmedido, a chuva a torrenciar, árvores desabando, após aquele tempo em que lhe parecera que o mundo tinha mergulhado no caos, acordava de um sono brevíssimo e percebeu que fora despertado pelo silêncio.
Ah, mas a palavra silêncio é, ainda, muito ruidosa. A palavra silêncio não transmite, nem de longe, aquele perfeito vazio sonoro, aquela absolutíssima ausência. Tocou com os dedos nas orelhas, para se certificar de que as tinha. O silêncio era real. Um silêncio de nada haver. Um silêncio: não de falta de ouvidos, mas de não haver o que ouvir...
Aproximou-se da janela com um estranho pressentimento. Um estranho e silencioso pressentimento. Abriu-a. E viu
que não existia nada. Que a tempestade medonha arrastara para algures tudo o que o rodeara até então, o passeio, o chão, as casas, os passarinhos, os cães, os cocós de cão, as grades, os carros, o café do senhor Eliodoro, o senhor Eliodoro do café, a mulher do senhor Eliodoro, os cabos, os risos, os parapeitos, os brincos, as nuvens, os tijolos, os túmulos, os caixotes para a reciclagem, os refrigerantes,
os portões, os gatos, os muros, as palmeiras, os triciclos, os aparelhos de rádio, os ladrões, a Ministra da Educação, os ministros, a voz, os ralhos, as vassouras, as pás de lixo, a roupa estendida, os blogues, os vampiros e as bruxas...
Não se tratava de ele, em sua casa, ter voado para longe. Ele mantinha-se na sua casa que se mantinha no mesmo sítio. Não havia era sítio algum. A casa mantinha-se firmemente no nada.
Sentou-se sobre a cama.
E perguntou-se: Bolas! E agora?!
Ah, mas a palavra silêncio é, ainda, muito ruidosa. A palavra silêncio não transmite, nem de longe, aquele perfeito vazio sonoro, aquela absolutíssima ausência. Tocou com os dedos nas orelhas, para se certificar de que as tinha. O silêncio era real. Um silêncio de nada haver. Um silêncio: não de falta de ouvidos, mas de não haver o que ouvir...
Aproximou-se da janela com um estranho pressentimento. Um estranho e silencioso pressentimento. Abriu-a. E viu
que não existia nada. Que a tempestade medonha arrastara para algures tudo o que o rodeara até então, o passeio, o chão, as casas, os passarinhos, os cães, os cocós de cão, as grades, os carros, o café do senhor Eliodoro, o senhor Eliodoro do café, a mulher do senhor Eliodoro, os cabos, os risos, os parapeitos, os brincos, as nuvens, os tijolos, os túmulos, os caixotes para a reciclagem, os refrigerantes,
os portões, os gatos, os muros, as palmeiras, os triciclos, os aparelhos de rádio, os ladrões, a Ministra da Educação, os ministros, a voz, os ralhos, as vassouras, as pás de lixo, a roupa estendida, os blogues, os vampiros e as bruxas...
Não se tratava de ele, em sua casa, ter voado para longe. Ele mantinha-se na sua casa que se mantinha no mesmo sítio. Não havia era sítio algum. A casa mantinha-se firmemente no nada.
Sentou-se sobre a cama.
E perguntou-se: Bolas! E agora?!
LÍNGUA PORTUGUESA: PEQUENO DICIONÁRIO DE NOVAS PALAVRAS E DE FRASES POPULARES RECICLADAS
Termo com que se designam guerras familiares provocadas pelo álcool: conflitro
Expressão popular com que se dá a entender que, ao contrário do que parece, em Alfama não há assim tanto sexo, droga e rock n roll (é mais sexo, droga e fado): É mais Alfama do que o proveito
Provérbio com que se recusa, a uma criança, que ela coma, de uma vez, todas as gomas que se encontram no saco que acabámos de comprar: Goma e Pavia não se fizeram num dia
Expressão popular com que se dá a entender que, ao contrário do que parece, em Alfama não há assim tanto sexo, droga e rock n roll (é mais sexo, droga e fado): É mais Alfama do que o proveito
Provérbio com que se recusa, a uma criança, que ela coma, de uma vez, todas as gomas que se encontram no saco que acabámos de comprar: Goma e Pavia não se fizeram num dia
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