sexta-feira, abril 25, 2008

OS RATOS DO GUARDA-FATOS [IV E ÚLTIMO]

Durante três dias e meio, não dei por que houvesse a menor alteração nas nossas vidas.
Na tarde do quarto dia, contudo, os ratos haviam desaparecido.
Rejubilei. Entoeei cânticos, executei a dança da vitória, chorei de tanto rir. Mandei instalar uma nova fechadura no guarda-fatos, calafetei buracos e fendas; lanchei com um apetite que já não conhecia desde o princípio daquela fatídica invasão...
Durante um lento e longo dia, nada de novo aconteceu. Parecia que tinham retornado ao seu planeta. Mais tarde, apercebi-me de que reinava uma inexplicável confusão no quintal do vizinho, o arrogante proprietário de flores; instalei-me, pois, à varanda, meio oculto, confortavelmente sentado numa cadeira reclinável, com um par de binóculos em punho, para não perder os mais minúsculos detalhes (posto que os detalhes são, frequentemente, a parte mais divertida de cenas cómicas), uma mesinha à mão de semear, repleta de pratos de amendoíns, bolachinhas, queijinhos. Ria-me, num quase insuportável gozo íntimo, que me abanava os ombros em frouxos de um riso contínuo e canino. Observava atentamente o caos.

De facto, não entendia o que sucedia. Hoje, pelo contrário, sei-o perfeitamente! Oh, se sei. Amaldiçoo o meu plano, aquela alegria de curta duração: o doido das petúnias tornara-se, não sei como nem graças a que medida, talvez com a ajuda de uma flauta, no incontestado líder das ratazanas. Vejo-os a todos, pelos meus binóculos (e estou sem vontade de continuar comendo amendoíns), vejo-os a construir poderosas e horrorosas armas. O quintal encheu-se de instrumentos bélicos. Que, ou quem, planearão eles invadir? Que acontecerá ao mundo? Pior do que isso: que será da minha casinha, que tanto me tem custado pagar?

Vejo-os, pois, esquecidos das flores, trajando Hugo Boss e Luigi Camapheu, armando perturbadores e suspeitos canhões, tanques e bazukas de raios lazer, naves e helicópteros davincianos.

Preparo a defesa. Guardo mantimentos: amendoíns, bolachinhas, batata frita, queijos. Cerro janelas. Não me matarão facilmente. Enviei Amélia e os garotos para casa da mãe. Espero-os de pé. Com um capacete esverdinhado - prefiro escrever deste modo a palavra, ao invés do sensaborão «esverdeado» - cheio de figuras dos Simpson!

FIM

4 comentários:

lara_1012 disse...

Eu sabia que tu lá no fundo achavas que o esverdeado era sensaborão. Desculpa, não resisti! :)

Gil Duarte disse...

Que faria se o não fosse, hein? (Acho que sabes a que vitória «esverdeada» me refiro...)
Desculpa, resisti pouco!

Unknown disse...

Qssss! Qssss! Busca! Busca!

lara_1012 disse...

O União de Leiria veste de esverdeado?