Naquele princípio de histeria que se apossou dele, lançou um berro. Esperava, talvez, que a família acordasse sobressaltada. Que descessem. Que o ajudassem. Que povoassem novamente o seu mundo de cenas e situações, vozes e gestos familiares e reconhecíveis. Mas ninguém respondeu ao apelo: e, no silêncio, o eco do seu berro, ou a memória do seu berro, assustou-o e obrigou-o a conter-se.
Aproximou-se do espelho, à espera de que fosse este a devolver-lhe, no reflexo do seu próprio rosto, um rasto e um resto de normalidade.
Mas o seu rosto, que o olhava do espelho, era diferente. Ele não era ele: aquela testa demasiado longa nunca fora a sua testa; nem aquela cabeça completamente calva (prenúncios de calvície, sim, fariam parte do reflexo esperado, mas não aquele crânio desértico que via agora); sobretudo aqueles olhos com que se olhava, desesperado, não eram os seus olhos.
Lembrou-se da «Metamorfose». Tranformara-se em quê? Transformava-se em quê? E com que direito se apoderava assim a ficção da sua própria vida?
Ouviu, então, uma voz:
- Calma, Kal-El! Chegou o momento! Não te assustes: chegou o momento!
(CONTINUA)
segunda-feira, outubro 20, 2008
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2 comentários:
Kal-El? Mas isto passa-se em Krypton? :)
Bolas, pá! A pessoa não consegue enganar uma conhecedora como tu. Sabes, pareceu-me um bom nome, muito ao género daqueles que encontro na linguagem extra-terrestre da minha filha (Cag-nia, Ya-úte, etc)
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