Julião conseguira que os pais o deixassem levar a sua mana, Perlimpimpim, às festas da Rã, nessa auspiciosa noite em que actuava Quim Barreiros.
A irmã pequenina, quatro minúsculos aninhos, dependurava-se-lhe da mão.
Julião nem por um momento largou a mão de Perlimpimpim. Atravessavam a multidão compacta de velhos e de jovens que dançavam euforicamente, enquanto, de um palco profusamente iluminado, Quim Barreiros, com o chapéu preto, o bigode e o acordeão, assentando-lhe como tiques pessoais, cantava as costumeiras cançonetas de duplo sentido.
Sentia a mão de Perlimpim enfiada na sua mão suada, no meio de rapazes que nadavam por entre a multidão, para salvar copos plásticos cheios de cerveja; sentia a mão presa ao corpinho da menina, o qual, mesmo pequenino, se lhe tornava pesado por causa da resistência que opunha: a menina que esbarrava com pessoas, ou que fazia força para ficar para trás, ou que tentava seguir noutra direcção.
Julião não a largava, porque temia mulheres ansiosas por ser mães, prontas a raptar, temia pedófilos, ladrões e traficantes de órgãos. Gostava de sentir o peso da resistência de Perlimpimpim, entre bêbedos e coros. Aliás, a menina habituava-se, ajustava-se-lhe ao movimento, seguia-lhe o ritmo: já lhe sentia a mãozinha mais leve, sem opor resistência, sem procurar outras direcções, sem se atrasar contra os corpos da multidão.
E Barreiros cantava, cantava, cantava...
Olhou, comovido, para a sua mana que o seguia agora tão sem luta, tão adestrada.
Olhou. Não havia mana. Havia a mão da mana. Só uma mão, decepada pelo pulso!
terça-feira, junho 09, 2009
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