sexta-feira, julho 25, 2008

CRÍTICA DA CRIAÇÃO DIVINA

Deus-Pai estava arrasado. «Ah», dir-me-ão, «não pode ser, e tal, Deus não fica arrasado, e tal, que é feito da Omnipotência, e coiso...?»!

Estava, sim. Estava. Precisavam de conhecer a Deusa-Mestra, que há uma Eternidade vinha pondo em causa a Obra divina. Acrescentava sempre, com a delicadeza conveniente, que, do ponto de vista estético, é claro, a Criação de Deus estava perfeita. Per-fei-ta - nem outra coisa se esperaria dEle.

«Acontece», acrescentava a Deusa-Mestra, «que a estética não pode ser pensada a não ser de acordo com a função das coisas. A funcionalidade é a palavra de ordem. Os seres podem ser bonitos, sim senhor, e nisso, Ó Deus, és Deus Único. Mas, e a funcionalidade...???»

Dava exemplos de «ligeiras» alterações que fora fazendo. Que lhe não levasse nada a mal, hã? Não era na substância, nem na estética - era na «funcionalidade», e só, que se deveriam introduzir emendas.

«Vejamos o homem», dizia. «Olha para os dedos; olha para a língua. Não vês o que está errado aqui? Eu explico. Já percebeste que, para provar, o homem vai ter de pôr em contacto, digamos, comida estragada, com a língua, no interior da boca, já dentro do corpo? E se quiser cuspir, não é verdade que certamente uma pequena parte já se escapou pelo sistema abaixo e começou a envenenar-lhe os estômago? Não. O paladar tem de estar na ponta dos dedos. O homem prova com os dedos, percebes? Saboreia com os dedos. Se não gostar, deita fora...»

Deus-Pai estava esgotado...

«E o rabo lá atrás? Olha que lindo. Para que lhe serve o rabo, com aquela forma almofadada, não é para o proteger? Não tem de ser assim uma espécie de pára-choques? Então tem de estar à frente, não é verdade? À frente é que se encontram os órgãos mais importantes, se ele cai de fronte é que se trata de uma queda fatal... o rabo tem de ficar, ou no peito, ou a proteger o sexo...»

Era inútil contra-argumentar.

«E o nariz ao pé da boca??? Em pleno rosto??? Que diacho de ideia. Assim cheira algo de mau cheiro e vomita, parece tudo um órgão único, nariz e boca, uma máquina para cheirar e vomitar, cheirar e vomitar. É disparate, Deus! Se tiramos o rabo lá de trás, passamos para lá o nariz...»

E, considerando, por um fragmento da longa Eternidade que iriam ter de passar juntos, que Deus-Pai pudesse estar a sentir-se ofendido, concluiu:

«É claro que, à parte estes pormenores, a tua Obra está bonita. Ah, muito bonita mesmo. Bonita a valer! Quanto a isso, nada a assinalar: és um espectáculo!»

2 comentários:

zorbas disse...

Deus Pai esgotado, nunca me teria passado pela cabeça!... Mas, trata-se de uma distração minha pois eu comheço pessoalmente a Deusa Mestra.

Unknown disse...

Conheces a Deusa-Mestra? Pessoalmente, Zorbas? Mete lá uma cunha, é que as questões estéticas têm que ser valorizadas, Deus do Céu!