Ao passar pelo templo consagrada ao Grande Designer do Universo, Lap sentia, como sentiu uma vez mais, inevitavelmente, uma grande força anímica que lhe dirigia os passos até ao interior do Ovo Central.
Ao encaminhar-se para o Ovo, sorriu à sacerdotiza que, no habitáculo da entrada, convidava os fiéis a desembolsar a sua livre contribuição. A santa mulher mal precisava de estender o aparelho: olhava com um olhar fixo e doce, sedutoramente intimidante, os seios opulentos descobertos, de forma a recordar que o corpo feminino representava a obra mais conseguida do Grande Designer do Universo, e acenava, de cada vez que alguém passava o cartão magnético pela ranhura do aparelho de esmolas. Uma vez no Ovo Central, Lap sentava-se no sofá que se dobrava sobre si, como um ovo, protegendo-o, acalmando-o, ajudando-o a respirar mais tranquilamente. Orava. «Ó Designer Supremo, agradeço-te!»; saía com lágrimas nos olhos.
Quando se dirigia a casa, passava por um bar. Sentava-se para beber um copo. Um «Blootea». Mas a estada no bar acabava por ser rápida. Às vezes, perguntava-se a si próprio por que raio não ficaria mais tempo sentado ao balcão, no banco de pernas longas, a conversar com o barman - mas a verdade é que, emborcado o vermelhíssimo «Blootea» (chá de sangue?), enfadava-se de estar sentado, descia e ia-se embora. Alguém ocupava de imediato o banco deixado vago.
Não nesse dia, porém. Nesse dia, reparou, com alguma estupefacção, numa mulher que, no banco ao lado do seu, onde, aliás, já se encontrava quando ele chegara, parecia ter-se tornado uma peça do mobiliário, como se ali estivesse há muito tempo. À frente dela, sobre o tampo do balcão, vários copos vazios sublinhavam que viera para ficar. Estava desgrenhada; devia ser do planeta Oork, a avaliar pelo focinho de gato e pelo tom esverdeado do cabelo. Suspirava.
- Olá, intruso -, disse a a rapariga, quando notou que Lap a observava.
- Intruso, eu!?
- Sim. Estás a invadir a minha tranquilidade. Pagas-me um «Blootea»?
Aquilo era novo. Tudo aquilo. A postura dela, a abordagem. O barman vigiava-a, atento.
(E, parece, continua).
quinta-feira, fevereiro 28, 2008
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3 comentários:
Ahhh! Adoro estas tuas histórias! A sacerdotisa chama-se Victoria? Principal? E o Blootea? Pode ser azul? Eu acho que é azul, pode ser? Vá láááá´! :)
Oh, era vermelho, não li bem... perdão, mestre Gil. Podia ser sangue azul, tájaber?
A mulher de Oork soa-me bem: focinho de gato... O cabelo verde, pode-se sempre pintar de outra cor!
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