sábado, junho 28, 2008

VAMOS A VER O QUE ISTO DÁ (I)

Na Via Láctea, entre «Cagnia» e «Ugnia», vemos seres que navegam solitariamente, com uma antena, se a têm, ou um tentáculo, ou o correspondente ao dedo polegar, indicando um certo sentido, na expectativa de uma boleia.
Nós raramente damos boleia a estas criaturas em órbita lenta, porque nunca sabemos com que contar. Alguns são assaltantes, há entre estes viajantes de ar inocente verdadeiros «serial killers» que se replicam rapidamente em centenas de militares, capazes de tomar, em poucos segundos, um veículo que os acolhesse.
Nesse dia, porém, aceitámos a bordo aquele viajante solitário: era o Professor Karamba, de Ugnia; não trazia malas, apenas uma mochila rudimentar. Um turbante brilhante cobria-lhe o crânio calvo, as orelhas ponteagudas e as pequenas antenas.
À noite, já refrescado, sentado comigo à mesa, disse-me, com a sua voz pausada, típica de Ugnia:
- Têm-vos acontecido constantes acidentes, não é verdade? Desastres, problemas vários, como se estivessem amaldiçoados...!
Ah, «como se estivéssemos amaldiçoados», como se nos houvessem rogado uma praga, era bem verdade: estas eram as palavras que, ainda há pouco tempo, ouvira da voz gaguejante e arquejante do imediato. Assenti.
- Percebi-o, logo que entrei. Detecto uma energia terrível; julgo que haja mesmo rotundas integalácticas em que a nave chega a perder velocidade, como se forças ocultas se apoderassem dela...
Eu estava boquiaberto. No ponto de Rana, por exemplo, a força parecia esavair-se-nos da nave, deixando-nos praticamente parados.
Professor prosseguiu:
- Só tenho uma coisa para lhe aconselhar. Faço-o gratuitamente, para lhe agradecer a boleia que acaba de me oferecer. Que preste muita atenção àquela criatura. Não sei dizer-lhe o que percebo nela, que mal, que intenso negrume, que luz invertida... mas há qualquer coisa de pouco limpo na sua aura. Preste-lhe muita atenção....
E, com a antena curtinha, como que cortada por uma lâmina, indicava Antuneqa, baixa, feia, corcunda, como todas as fêmeas de Yaúte. («Feia» do meu ponto de vista; em Yaúte, Antuneqa sempre fora muito apreciada...)
Olhei-a.
Antuneqa olhou-me.
Desviei os meus olhos, com um arrepio...

(CONTINUA)

Sem comentários: