domingo, junho 29, 2008

VAMOS A VER O QUE ISTO DÁ [II]

Lembrava-me bem do início da nossa imensa viagem, e daquela impressionante discussão com Antuneqa e o seu grupo, em que cheguei a perguntar-me se não se trataria de uma revolta para se apoderarem da nave.
Havia ordens claras de Sir Mäix. Eu falara com ele, vendo a sua imagem virtual mesmo diante de mim.
Ninguém gostava de Sir Mäix, e com razão, até com razões inúmeras mas, dessa vez, as suas ordens, algo com a simplicidade de:«Evitem as naves dos Glauss; eles estão em pé de guerra, andam a armar-se furiosamente e vocês têm um armamento muito reduzido e em péssimas condições...», pareciam de uma sensatez indiscutível. No resto, Mäix podia continuar a não ter razão, e eu a opor-me a ele na medida das minhas possibilidades. Podia continuar a ser um líder sem escrúpulos e odiado. Mas teria eu de o contestar, lá porque era Sir Mäix, se, um dia, me dissesse por exemplo: «A Antuneqa é muito feia!»? - E se eu concordasse, faria isso de mim um lambe-botas, um fiel de Sir Mäix???

Tive dificuldade em entender aquele levantamento do grupo de Antuneqa: todas fêmeas do mesmo planeta de onde os machos haviam sido extintos, todas feias - na minha perspectiva, claro, segundo valores e critérios terráqueos -, numas vozes estridentes e contundentes, que optavam pela intensidade em vez de argumentos...
Gyllia, talvez pior do que Antuneqa, berrava:
- Se eu vir uma nave Glauss, garanto que disparo. Desato a disparar, eu. Não me escondo, eu. Nunca me escondi, eu. De nada, de ninguém. Disparo nem que seja com um revólver de luz.
Tive de gritar mais alto, a minha voz possante e treinada quebrando o nevoeiro sonoro.
- Está a dizer, Gyllia, que vai desobedecer às ordens?
- Não... sim... eu... não é bem isso, mas eu... eu...
- Porque se assim for, diga-me já, que tomarei as devidas medidas!
- Não. Mas. Eu. Sim. Não, não, não, não. Mas quero deixar expresso o... o... o meu protesto. A ordem de Sir Mäix não faz sentido.
E redigia já um texto confuso, que riscava e retomava, numa folha já com diversos cortes e rasgões, muito feia, muito triste, muito como o beco sem saída por onde enveredara.

[CONTINUA]

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