Eu bem sei que o Miguel Sousa Tavares e o Emídio Rangel são idiotas. Ponto final.
Não obstante, quando leio os seus artigos a transbordar de peçonha, conduzidos por aquela falta de objectividade que anuncia ressentimentos e raivas de outros carnavais, acabo sempre por me perguntar como diacho veria eu a luta dos professores se, acaso, a não vivesse por dentro. Imagino que sou um cidadão comum, medianamente informado. Um manga-de-alpaca, um vendedor de gelados, um Serafim Lampião que está, à noite, sentado, com a família, diante da televisão, ouvindo a senhora dona Lurdes Rodrigues de mãos postas, os dedos unidos nas pontas, entrevistada por uma Judite de Sousa que lhe não dá réplica («mas ó senhoga ministga, a senhoga não acha que...?»), ou ouvindo o senhor habilidoso da Confederação de pais, ou seguindo sequências rápidas de imagens da manif que juntou cerca de cem mil, dos quais, entretanto, eram focados alguns, cinco ou seis, respondendo, em geral desnorteadamente, à simples pergunta: «Afinal, por que protestam os senhores?!» Imagino que tenho um filho, dois filhos, três filhos na escola pública; imagino que nenhum dos meus filhos fosse um barra, imagino que houvesse negativas aqui e ali e, naturalmente, recados na caderneta; imagino que o mais velho, viciado do telemóvel, advertido várias vezes por um professor - farto de o aturar mais o aparelho sob o tampo da secretária, teclando mensagens de amor durante as aulas -, me chegaria sempre a casa com fúrias e indignações inauditas contra todos os docentes, e histórias das perseguições que lhe moveriam concertadamente. Que pensaria eu da justeza da luta dos professores? Até que ponto compreenderia - eu, Serafim Lampião, adequadamente invejoso dos professores que, tal como os veria, «trabalham pouco, não querem trabalhar mais, têm férias longas» e, pelos vistos, «agora nem sequer querem ser avaliados»?!
Estaria capaz de compreender o sentido desta indignação?
Teria noção de até que ponto este ministério vem escangalhando sistematicamente as mínimas possibilidades de um ensino sério e responsável?
Perceberia as implicações e os estragos inflingidos, quase até ao ponto do não-retorno para os próximos dez ou quinze anos? (Sim, sempre fui um optimista!)
Perceberia, ao menos, a insanidade que constitui admitir que, ainda que as medidas fossem justas e correctas, nunca poderiam ter qualquer razão de ser se incompreendidas e rejeitadas por milhares de professores?
Hesitaria?
Sentir-me-ia perturbado?
Pensaria duas vezes?
A minha pergunta, no fundo, resume-se a este pouco: não será tão obtuso como estar no posto de ministro da Educação CONTRA os professores - o lutar contra as medidas ministeriais sem conquistar a opinião pública, isto é, sem tratar simultaneamente de a conquistar???
E esta pergunta tem, como é evidente, uma alínea: como se ganha um país sistematicamente desinformado?
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