O método de Gonçalo M. Tavares consiste em olhar para um objecto simples, corriqueiro - digamos: um telefone. Para que serve um telefone? Para duas pessoas se falarem. Que lembra um telefone, ou que animal falante poderia evocar? Um papagaio. Eis estabelecido o princípio da analogia. Mas dizer que um telefone é um papagaio soa demasiado simples, seria preciso tornar a analogia mais completa e mais complexa. O que evoco agora é um papagaio pousado sobre fios de alta tensão, e esta ideia de uma ave palradora que tivesse fugido, por exemplo, e pousado nos fios, entre postes, permite-me completar a ideia, precisamente porque, num telefone, também se trata de fios.
Diria, por exemplo: um telefone é um papagaio sobre fios eléctricos - não pousado neles, mas ligado a eles.
Este método é um delicioso propiciador de paradoxos, de imagens tanto mais ricas quanto maior for o engenho. Também é fácil cansarmo-nos, quando a técnica começa a espreitar demasiado sob os efeitos, como um mágico que, inadvertidamente, deixa os fios e os arames transparecerem. Enquanto não transparecem, é pura magia: um movimento de uso lúdico das palavras, o retorno a uma recriação quase infantil das coisas mais banais do quotidiano.
Aconselho uma visita à Biblioteca Municipal de Oeiras. Ao longo das paredes, ao pé das estantes - não sei até que data - encontram painéis onde Gonçalo M. Tavares deixou escritos alguns destes paradoxos: o que são os sapatos, o que são os óculos, o que é um novelo de lã.
sexta-feira, março 24, 2006
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